O que os números não nos dizem? Ir além das estatísticas na promoção do cuidado masculino em Portugal

Por Sofia José Santos
Este artigo foi publicado originalmente por Equimundo.

A man puts his arm around his daughter's shoulder in Portugal.Em termos de progresso global em direção à igualdade de género, Portugal está a par com muitos outros países da União Europeia (UE) e tem uma das políticas de licença-paternidade mais progressistas da UE em termos de duração e remuneração.

Desde 2009, os pais portugueses têm direito a 20 dias úteis de licença-paternidade remunerada – e é obrigatório que eles tirem pelo menos 10. Para os 20 dias completos, a licença-paternidade é compensada em 100% do salário mais recente de um indivíduo. Posteriormente, um casal pode desfrutar de um mês adicional de licença remunerada, "bônus" (compensado em 83% do salário mais recente de cada pai) se for compartilhado e usado simultaneamente por ambos os pais. Pais com filhos de 12 anos ou menos também têm direito a trabalhar em horários flexíveis, o que apoia ainda mais os pais em seu papel de cuidadores ativos.

Portugal é, ao mesmo tempo, um dos países mais afetados pela atual crise econômica e financeira europeia, principalmente depois que o governo começou a implementar cortes de gastos e aumentos de impostos para cumprir com o pacote de resgate financeiro da troika acordado em maio de 2011. Desde então, a legislação que concede licença-paternidade em Portugal tem sido cada vez mais ameaçada; muitos direitos trabalhistas – como a licença-paternidade – já foram informalmente enfraquecidos devido aos medos dos trabalhadores de serem demitidos ou rebaixados e ao crescente estresse financeiro sentido por muitas famílias portuguesas.

Surpreendentemente, porém, o número de pais que tiram licença-paternidade não obrigatória tem aumentado consistentemente em Portugal desde 2005, tendo registado apenas uma ligeira quebra em 2013. Por cada 100 mães que tiraram licença de maternidade, 43 pais tiraram licença de paternidade não obrigatória em Portugal em 2005; em 2011 (ano em que começou o programa de ajustamento estrutural da troika europeia), por cada 100 mães que tiraram licença de maternidade, 60 pais tiraram licença de paternidade não obrigatória. Em 2013, este número aumentou para 63, depois de ter atingido 64 em 2012.

Mas o que os números não nos mostram?

Os números sugerem, portanto, uma tendência positiva geral no uso da licença-paternidade pelos homens em Portugal. Há, no entanto, vários aspetos importantes que estes números não conseguem mostrar. O que estes números não nos mostram é a pressão que os pais enfrentam dos colegas de trabalho e dos empregadores não tirar licença-paternidade, nem nos mostram o estresse financeiro que influencia diretamente as expectativas e realidades de ser pai no Portugal atual. Esses números não exploram o fato de que a ideia de uma paternidade mais engajada ainda coexiste com os papéis tradicionais atribuídos aos homens, apesar do declínio das noções patriarcais de família e gênero na sociedade portuguesa. Esses números não incluem a desempregado ou trabalhadores precários, que representam uma grande parcela da população.

Esses números também não nos mostram que o setor da saúde em Portugal, apesar dos esforços progressivos em direção à igualdade de gênero na parentalidade, ainda descarta o envolvimento dos pais no cuidado como menos importante do que o das mães. Muitos futuros pais ainda testemunham, por exemplo, que seu envolvimento como pais iguais não é levado em consideração quando comparecem às consultas pré-natais com suas parceiras.

Envolvendo os pais por meio de pesquisa e ação

Reconhecendo a importância de ir além dos números, a Equimundo-Europe juntou-se à aliança global Cuidados com os homens campanha lançando a campanha da paternidade portuguesa Eu sou pai com outros parceiros locais, e está atualmente realizando pesquisas para entender a evolução e o estado do cuidado masculino em Portugal. A campanha busca explorar as maneiras pelas quais a licença parental e o papel dos pais como cuidadores podem ser afetados pelo contexto de estresse financeiro e econômico causado pelas recentes medidas de austeridade no país. A campanha MenCare em Portugal tem como alvo três setores e públicos específicos:

  1. Comunidades: A campanha busca conscientizar o público sobre a importância de envolver os homens na prestação de cuidados por meio de campanhas na mídia comunitária.
  2. Profissionais de saúde, educação e serviços sociais: A campanha treina grupos profissionais nos setores de educação, serviços sociais e saúde, equipando-os para conduzir workshops e conscientizar seus beneficiários sobre igualdade de gênero e sobre a necessidade de envolver os homens na prestação de cuidados.
  3. Empregadores: A campanha tem como alvo empregadores públicos e privados com mensagens sobre os benefícios da licença-paternidade para seus trabalhadores e para suas empresas e instituições.

Este trabalho estimulante já começou e há muitos desafios pela frente! Visite www.homens-cuidados.org e www.eusoupai.pt para saber mais.

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